Hélène Smith (1861-1929), evidentemente, não era uma vidente de verdade. Mas sua farsa era notavelmente ambiciosa. Ela dizia ser uma reencarnação de uma princesa hindu e de Maria Antonieta.
Mas Mademoiselle Hélène Smith foi também um ícaro espiritualista. Não se contentando em ser uma reencarnação única de duas princesas de épocas e lugares distintos, ela decidiu voar mais alto. Hélène afirmava ser capaz de visitar Marte:
Que engraçados, esses carros! Dificilmente há qualquer cavalo ou pessoa a puxá-los. Imagine diferentes tipos de poltronas que se movem mas não têm rodas. São as pequenas rodas que produzem as faíscas. As pessoas sentam em suas poltronas. Algumas, as maiores, levam quatro ou cinco pessoas. À direita do braço da poltrona está espetado um tipo de vara, que tem um botão, o qual é pressionado com o polegar para por o veículo em movimento. Não há trilhos. Também se vê pessoas a pé. Elas são constituídas como nós e seguram-se com pequenos dedos. A vestimenta é a mesma para ambos os sexos: uma blusa comprida de gola alta, calças bem largas, sapatos de couro, com solas grossas, sem salto e cuja cor é a mesma do resto do conjunto: branco com detalhes em preto.
Entre 1894 e 1901, Mlle. Smith deu mais de 60 sessões, detalhando inclusive a suposta língua marciana. Suas “visões” inspiraram o livro Des Indes à la Planete Mars [Da Índia ao Planeta Marte], publicado em 1900 pelo (para)psicólogo suíço Théodore Flournoy (1854-1920).
Flournoy (à esq.) fora amigo próximo de Catherine-Elise Müller (o verdadeiro nome de Mme. Smith), mas — talvez cedendo ao ceticismo de seu lado científico — ele não conseguiu engolir a história sobre Marte. Ele afirmava que as descrições do povo marciano eram baseadas no orientalismo que estava em moda (too mainstream); que o Planeta Vermelho apresentado pela médium era excessivamente “material”, pois se parcecia muito com a Terra. E a suposta língua marciana, com suas 22 letras e sua gramática era muito semelhante ao francês. Ele classificou Catherine Müller como um caso de “sonambulismo com glossolalia”. Depois dessa, a carreira de Mademoiselle Smith deveria ter ido para o espaço.
Mas não foi. Uma tal de Mrs. Jackson, rica (e crédula) espiritualista norte-americana, continuou impressionada e ofereceu-lhe dinheiro. Em troca, Catherine Müller deveria largar o trabalho e se dedicar exclusivamente à documentação de suas visões. É claro que Hélène Smith aceitou. E, como já não era mais boba, passou a ter visões mais “aceitáveis” — com Cristo. Pra quem começara vivendo como duas princesas e viajando pra Marte, foi um final bastante decadente.
Para os curiosos (ou ociosos) de plantão, a primeira edição de From India to the Planet Mars está disponível on-line [em inglês].
Pff, até eu já fiz um alfabeto alienigena, um planeta alienigena, e uma raça inteira com sua propria cultura u.u
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